NOTÍCIAS06/10/2025 Conferência Nacional por IA com Direitos Sociais debate futuro do trabalho e regulação da tecnologia no Brasil
A programação começou com a abertura oficial, que contou com a participação de autoridades, representantes das centrais sindicais, da Frente de IA com Direitos Sociais – Ceará, além de reitores de universidades federais e do reitor da UFABC. Em seguida, foram realizadas homenagens especiais ao professor Ladislau Dowbor (PUC-SP) e ao deputado estadual Eduardo Suplicy (PT-SP), em reconhecimento às contribuições acadêmicas e políticas de ambos para a defesa da justiça social e da democracia. Diagnósticos e desafiosA primeira mesa da manhã foi dedicada a uma análise crítica sobre o cenário global e nacional da inteligência artificial. O sociólogo e professor da UFABC Sérgio Amadeu e a cientista da computação Nina da Hora trataram dos temas “Nova Divisão Internacional do Trabalho e a Desigualdade” e “Controle Corporativo: Big Techs”. O painel destacou os efeitos da concentração de poder econômico e tecnológico nas mãos de poucas empresas e os impactos para a soberania digital e para a autonomia dos trabalhadores. Sérgio Amadeu demonstrou como o avanço da inteligência artificial vem sendo incorporado pelos interesses militares de grandes potências, especialmente os Estados Unidos, numa fusão perigosa entre capitalismo de vigilância e militarismo digital. Ele alertou para a transformação da guerra em um “sistema tecnocrático, no qual dados e IA são tão cruciais quanto armas”, descrevendo sistemas que mapeiam populações inteiras para definir alvos. Amadeu também citou o embate entre Elon Musk e o Supremo Tribunal Federal (STF), lembrando um ofício das Forças Armadas que alertava para a dependência da rede Starlink, de Musk, para a mobilização de tropas. O professor ainda criticou o conceito de “nuvem soberana” vendido por empresas de tecnologia no Brasil. “Atualmente, temos ‘nuvem soberana’ da Oracle, da Microsoft, da Amazon. É um produto”, afirmou, destacando o CLOUD Act dos EUA, que obriga empresas americanas a fornecer dados ao governo norte-americano, independentemente de onde estejam localizados os servidores. Para ele, a conclusão é clara: “Não há soberania nacional hoje sem soberania digital.” Nina da Hora, por sua vez, destacou que a tecnologia deve ser pensada além dos dados, considerando a interação humano-computador. Ela criticou a abordagem extrativista das big techs, que prioriza o lucro em detrimento do ser humano. “O debate sobre o papel das big techs na democracia exige não apenas regulamentação, mas também uma mudança de perspectiva: é preciso pensar em tecnologias que coloquem o ser humano no centro, promovam o bem-estar coletivo e respeitem os limites éticos. Só assim será possível transformar a tecnologia de um instrumento de controle em uma ferramenta de emancipação social”, afirmou. O futuro do trabalhoA segunda mesa discutiu “IA e o Futuro do Trabalho: Substituição ou Complementaridade?”, com a professora da UFABC Luci Praun e o sociólogo da Unicamp Ricardo Antunes. O debate trouxe visões distintas sobre como a inteligência artificial está reconfigurando postos de trabalho, intensificando a precarização em alguns setores, mas também podendo abrir espaços para novas formas de ocupação profissional. Ricardo Antunes apresentou uma análise crítica, alinhada à sua perspectiva marxista. Para ele, a IA, sob a lógica capitalista, tende a aprofundar a precarização e a desigualdade. “A tecnologia não é neutra. No capitalismo, a IA é comandada por grandes corporações para maximizar o lucro, concentrando renda nas mãos de poucos em detrimento da maioria”, afirmou. Ele previu um “desemprego descomunal”, sobretudo pela automação de tarefas repetitivas. Em vez de liberar o ser humano para atividades criativas, a lógica atual tem levado à perda de postos de trabalho e ao avanço da uberização e pejotização. “O trabalhador se submete a uma servidão moderna, com intensificação dos ritmos e redução dos direitos trabalhistas”, disse. Já Luci Praun destacou que as plataformas digitais reproduzem velhas formas de exploração com uma linguagem do século XXI. Ela alertou para a ofensiva das corporações em desregulamentar mercados e flexibilizar contratos de trabalho, reduzindo direitos. Lembrou que a reforma trabalhista de 2017, sob Michel Temer, teve como objetivo central garantir segurança jurídica ao empresariado, em detrimento dos trabalhadores. A professora ressaltou também como mecanismos como bonificações por metas e flexibilização de salários estimulam competição entre trabalhadores, corroendo a coletividade e naturalizando o pagamento por produção. “Alterações na dinâmica de acumulação de capital ensejam mudanças nas formas prevalentes de sociabilidade”, observou. Para ela, a noção de “pleno emprego” é ilusória, já que não considera as múltiplas formas de inserção precária no mercado de trabalho. Movimento sindical na era digitalNa parte da tarde, os debates se voltaram para as alternativas e estratégias de enfrentamento. A mesa “A luta por direitos sociais e sindicais na era da inteligência artificial” reuniu a vice-presidente da CUT Nacional e presidenta da Contraf-CUT, Juvandia Moreira, e o diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Wellington Damasceno, que reforçaram a necessidade de organização coletiva diante das mudanças impostas pela IA. Em sua palestra, Juvandia destacou que a inteligência artificial é uma tecnologia disruptiva, baseada em padrões de dados e marcada por vieses históricos, o que exige regulamentação séria no Brasil. Ela apresentou pontos do Projeto de Lei n.º 2.338/2023, em debate na Câmara dos Deputados, defendido pelas centrais sindicais com propostas de aprimoramento, como a garantia de negociação coletiva e a limitação do monitoramento excessivo. A dirigente também lembrou conquistas da categoria bancária em 2024, como a proibição de vigilância invasiva, a criação de uma Mesa Permanente de Negociação sobre o impacto da IA e cláusulas específicas para requalificação profissional. No Brasil, a regulação da IA é discutida justamente a partir do PL 2.338/2023, aprovado no Senado em 2024. Embora o texto tenha sido considerado mais completo na primeira versão, as centrais sindicais defendem alterações para assegurar proteção efetiva aos trabalhadores. Entre as propostas apresentadas estão:
O setor bancário aparece como estudo de caso, já que investe mais de R$ 40 bilhões por ano em tecnologia e 96% das instituições já utilizam IA em seus processos. “Em 2024, a categoria conquistou cláusulas inovadoras, como a proibição da cobrança de metas por aplicativos, o direito à desconexão, verbas para requalificação e cursos específicos para mulheres em TI. Também foi instituído um Observatório de IA, responsável por acompanhar softwares, aplicações e impactos no setor”, lembrou. Um desafio recente, citado como exemplo por Juvandia, foi o caso do Itaú, que demitiu 1.175 trabalhadores com base em softwares de monitoramento de “disponibilidade digital”. “A prática, sem transparência ou direito a contestação, gerou precarização, sobrecarga e violação da privacidade, levantando críticas à ausência de regulação.” Para Juvandia, o caminho é claro: “A inteligência artificial não pode ser usada para aprofundar a exploração e a precarização. Nosso desafio é garantir que essa tecnologia esteja a serviço da sociedade, protegendo empregos, ampliando direitos e fortalecendo a democracia.” Wellington Damasceno acredita que “a discussão da inteligência artificial é uma disputa política, é uma disputa ideológica e é uma disputa de classes. Se a gente começar a entender isso, podemos começar a acumular forças para, de fato, chegar nos pontos que a Juvandia muito bem apresentou.” O metalúrgico acredita que grande parte da taxação imposta pelos EUA aos produtos brasileiros é uma retaliação e está ligada a essa disputa dos dados. “A gente fala muito de regulamentar big techs, mas fala pouco sobre regulamentação da inteligência artificial. Este é o novo conflito geopolítico que está na mesa e a gente ainda não tem noção da capacidade de estrago e de aprofundamento das desigualdades e da mudança de conceito de guerra que a inteligência artificial pode trás para nós.” DesafiosEm seguida, o painel “Desafios da Regulamentação da IA no Congresso Nacional” trouxe o ex-ministro José Dirceu e o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), que defenderam a urgência de um marco regulatório capaz de assegurar transparência, proteção de dados e políticas públicas voltadas ao interesse da sociedade. Carta de São Bernardo e próximos passosNo encerramento, foi lida e aprovada a Carta de São Bernardo do Campo, documento que sintetiza as reflexões e propostas da conferência em defesa de uma inteligência artificial regulada, democrática e comprometida com a justiça social. Logo depois, foi constituída a direção da Frente por Inteligência Artificial com Direitos Sociais – Brasil, que terá como missão articular entidades, pesquisadores e movimentos sociais em torno dessa pauta estratégica. A conferência terminou com o compromisso coletivo de manter o debate sobre a inteligência artificial a partir da ótica da defesa dos direitos sociais, do trabalho digno e da soberania nacional. Fonte: CONTRAF |
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